Q BISONHA
My life is inspired in a true story
terça-feira, 22 de outubro de 2013
ISTO NÃO FICA ASSIM!: «Os Livreiros e o seu Património»
ISTO NÃO FICA ASSIM!: «Os Livreiros e o seu Património»: Biblioteca Municipal Camões Largo do Calhariz, 17 – 2.º Esq.º, Lisboa (junto ao Elevador da Bica) 22 de Outubro de 2013, 18:15 ...
sexta-feira, 30 de agosto de 2013
SOSSEGAR
HEART by Ana Ventura |
O que eu mais queria neste mundo era sossegar. Eis um verbo que é preciso redimir. Sossegar não é descansar, nem traz felicidade, nem se assemelha, senão superficialmente, à paz ou à tranquilidade. Não quero acalmar-me, ou serenar, ou assentar. O sossego é um estado de bonança.
O sossego é um estado de excepção, em que a alma vem ao encontro do corpo. Pode sossegar-se em momentos de grande agitação, de um acesso de amor, em que esse amor parece lucidez. É este o sossego com que sonho — uma presença consciente de verdade no que se sente -, oposto à parança estúpida, queda e adormecida, falsa, aquém da alerta. Não gosto do sossego como alívio ou interrupção. Nem gosto da maneira como se usa o verbo descansar, que deveria significar repousar (recuperar as forças, etc.) em vez de sossegar, como por exemplo: «Ainda bem que me avisaste, porque assim fico mais descansada». É tão ridículo como uma criada dizer: «A senhora não pode vir ao telefone porque está a sossegar». Na época do stress e dos calmantes, das psicoterapias e das manias new age, sossegar foi destituído da sua beleza própria, da sua frescura, da sua actividade.
Sossegar não é descansar - não é uma consequência do cansaço. Quando Rebelo da Silva, citado por Moraes, que por sua vez cita o dicionário de Freire, diz «O coração não sossega, a vida cansa», ambas as coisas são verdadeiras, mas a associação é enganadora, porque o coração não sossega por causa de a vida cansar. Há cansaços bons. Não. O coração não sossega, porque não tem com que sossegar. Mais que a felicidade e a paz, o mundo precisa de sossegar.
O sossegamento é a forma mais precisa de liberdade. Mas não é uma liberdade negativa (estar livre de medos, de constrangimentos, de opressões), mas uma liberdade positiva — uma liberdade para sentir o que se sente e confiar no que se sente, e ter tempo, e vontade, e confiança no que se faz. Quando se olha para o rosto duma pessoa amada, ou se recebe dela um gesto de amor, sossega-se. Quando se sabe de antemão o que vai acontecer, ou como alguém se vai comportar, sossega-se. Quando se participa num acto de bondade, ou se assiste a um, sossega-se. Quando se é desculpado, sossega-se. Quando se faz uma promessa ou um plano que sabemos que se irá cumprir, sossega-se. Isso é sossegar. Quando dois amantes decidem ter um filho, por muito medo que isso possa provocar, sossega-se. Quando aparece um amigo sem avisar, interrompendo tudo o que se tencionava fazer, sossega-se. Quando se está a lutar contra a injustiça e a maldade, com todas as forças que se tem, sossega-se. Quando se lê um poema ou uma história bonita, por muito triste que seja, sossega-se. Quando se acredita em Deus. Isso, sim, é sossegar.
Gosto de sossegar como verbo transitivo. Sossegar só por si não chega. É mais bonito sossegar alguém. Quando se pede «Sossega o meu coração» e se consegue sossegar. Quando se sai, quando se faz um esforço para sossegar alguém. E não é adormecendo ou tranquilizando, em jeito de médico a dar um sedativo, que se sossega uma pessoa. É enchendo-lhe a alma de amor, confiança, alegria, esperança e tudo o mais que é o presente a tornar-se, de repente, futuro. É o futuro que sossega. «Amanhã vamos passear» sossega mais que «Não te preocupes» ou «Deixa lá, que eu trato disso». A aquietação, como o sono, é uma espécie de morte. Sossegar não é jazer. É viver. Uma pessoa sossegada é capaz de deitar abaixo uma floresta. O sossego não é um descanso — é uma força. Não é estar isolado e longe, deixado em paz - é estar determinado no meio do turbilhão da vida.
O sossego é, em grande parte, uma expressão espiritual de segurança. Sossegar é saber com o que se conta, desde o azul do céu aos irmãos. O coração sossega em quem se conhece. Sossegar é conhecer uma totalidade, as coisas feias ou bonitas, mas previsíveis e familiares. É por isso que sossega olhar para um rosto amado, que se conhece, ouvir a voz dessa pessoa, mesmo quando está a dizer disparates. Não há falinhas mansas que tragam o sossego dos gritos duma pessoa com quem se pode contar. E um alívio. Só a ordem pode sossegar, por muito alterosa que seja. A tempestade sossega o marinheiro que conhece bem o barco e o mar.
No nosso tempo as pessoas querem o sossego menor das sopas e do descanso. Serem «deixadas» dalguma forma ou doutra: «Eu quero é que me deixem em paz». Querem fugir. Querem ir para o campo. Meditar. Descobrir o «eu» interior. Mas a solidão e o silêncio não sossegam. Para isso mais vale tomar um Lexotan. Só os outros nos podem sossegar mesmo no meio da vida, em plena acção, se pode, e vale a pena, estar sossegado. O «eu» interior é uma algazarra de desasossego. Para mais, árida e desinteressante. O budismo de trazer por casa que invadiu a nossa cultura, uma espécie de narcisismo espiritual, traduz uma noção repugnante de superioridade. Os outros podem ser o inferno, mas cada indivíduo ainda o é mais. Não me saem da cabeça os instantes, poucos, em que me senti sossegar - e foi sempre graças a outra pessoa, vista ou lida, conhecida ou desconhecida, viva ou morta, menina ou crescida, sábia ou maluca, próxima ou longínqua, mas sempre presente, mais presente que eu próprio. Eu próprio, por defeito, talvez, não consigo lá chegar. Nunca encontrei o sossego nos outros — foram sempre os outros que me sossegaram. E quase nunca deliberadamente. Lembro-me, em particular, dum momento, que obviamente não vou contar, mas que consistiu apenas em olhar para alguém e sentir que tudo nela me era querido e conhecido e familiar.
Não há no mundo paisagem como o rosto duma pessoa amada, sobretudo quando está agitado, a rir-se ou a zangar-se, desprevenido,apanhado nos nossos olhos como se estivesse dentro deles já. Sentir essa mistura de perdição e de proximidade é verdadeiramente sossegar.
Miguel Esteves Cardoso, Explicações de Português (texto com supressões)
quinta-feira, 7 de março de 2013
BORBOLETA
BORBOLETA
A borboleta que poisou
no teu mamilo perdeu
vontade de voar.
Jorge de Sousa Braga
A borboleta que poisou
no teu mamilo perdeu
vontade de voar.
Jorge de Sousa Braga
1 MINUTE OF SILENCE
Um minuto de silêncio
"Nos anos 70, Marina Abramovic viveu uma intensa história de amor com Ulay. Durante 5 anos viveram num furgão realizando todo tipo de performances. Quando sentiram que a relação já não valia aos dois, decidiram percorrer a Grande Muralha da China; cada um começou a caminhar de um lado, para se encontrarem no meio, dar um último grande abraço um no outro, e nunca mais se ver.
23 anos depois, em 2010, quando Marina já era uma artista consagrada, o MoMa de Nova Iorque dedicou uma retrospectiva a sua obra. Nessa retrospectiva, Marina compartilhava um minuto de silêncio com cada estranho que sentasse a sua frente. Ulay chegou sem que ela soubesse e... Foi assim."
(Traduzido por Rodrigo Robleño)
"Nos anos 70, Marina Abramovic viveu uma intensa história de amor com Ulay. Durante 5 anos viveram num furgão realizando todo tipo de performances. Quando sentiram que a relação já não valia aos dois, decidiram percorrer a Grande Muralha da China; cada um começou a caminhar de um lado, para se encontrarem no meio, dar um último grande abraço um no outro, e nunca mais se ver.
23 anos depois, em 2010, quando Marina já era uma artista consagrada, o MoMa de Nova Iorque dedicou uma retrospectiva a sua obra. Nessa retrospectiva, Marina compartilhava um minuto de silêncio com cada estranho que sentasse a sua frente. Ulay chegou sem que ela soubesse e... Foi assim."
(Traduzido por Rodrigo Robleño)
sábado, 9 de fevereiro de 2013
"Until the moment when God is destroyed by the extreme exercise...
"Until the moment when God is destroyed by the extreme exercise...
Six seated persons. Their bodies have the word. Their “becoming together” is announced through an unstable language, an English with particular sonorities. Their communication capacities are constantly challenged. They float between transparency and opacity; they exercise themselves between the knots weaving, suspended by a thread.
How to exercise the theatrical situation until exhaustion? To choose a language that is common to us, but that we do not dominate. The “here and now” that we look for is so lengthened that there is no longer a belonging. It is destroyed. We always restart, without ever returning to the same point.
Bojana Bauer
A light and recalcitrant work, Vera Mantero and five performers explore a single proposition that revolves almost completely around language, or better around speech, but also mumbling, grumbling, growling, meowing, humming, stammering and singing. Gestures and dance emerge where the body transforms into an ear or a peculiar soundboard. The piece embraces with theatrical joy an (im)probable future social body and doesn’t shun from the literal or kitsch. Language as a possibility to say ‘we’ and thereby affirm or ‘speak out’ the actual difference of the world we live in – on a political level the work reminds me of Jean-Luc Nancy’s writings. Since collaboration and creation are a social process itself, The extreme exercise has travelled a great distance between its première in Brest and the performances in Brussels: from a strict version that stresses the group as an outlandish choreographic machine, to a loose, ‘juicy’ one that takes as a point of departure the performer’s freedom in dialogue with the public, as yet another social body. Yet potentially it still commutes between these two extremes, voicing the lingering energies and imaginations of a vast spectrum.
Jeroen Peeters
“Almost unisono, but with different accents and facial expressions, they hold a speech about profound and banal ideas alike, without any distinction. No wonder that even after one hour they don’t reach a conclusion. Because of that, the only aim of this piece seems to be to celebrate the bare fact that public and performers are together, contemplating each other. “We are a group, you are a group...” returns as a refrain in the mash of words. As such, the acting of the six performers, their eccentric dresses and the way the public reacts to all this “make” the piece…
…the speech itself does not take place in an indifferent space but on a stage. And a stage is different from a street or a square. It is an empty space, without preconceived meanings or uses, but that is exactly why it arouses great expectations. When the curtain goes up we expect that everything that is there to be seen has a Meaning with a large M. Nobody stumbles on a stage like as they would do on the street. Certainly not if the title of the piece announces such concerns as the Death of God or “the extreme exercise of Beauty”.
Now, this is of course a grotesque speech. Who has still anything significant to add after all that has already been said or written about this? Don't we postulate the terms of God and Beauty above all to seal a breach in our worldview? Are these therefore not empty spaces, onto which everyone projects, after his own taste, his own “meaning of life”? The empty space of the stage meets in Vera Mantero’s work the empty space of words: she takes hold of the emptiness of the stage to hint at the emptiness of any significance. But she does this without despair. The meandering chat that the performers all produce in their own singular way, shows that a group of people “works”, even without God or Beauty. This is the meaning of the casual variant of “we are a group, you are a group...”. All of a sudden it becomes: “we are, you are... a theory, full of life”. Nothing has been proved, but “it works”.
Lauro’s mise-en-scène expresses this convincingly. A strong battery of spotlights frames the big stage, and in this way almost reduces the actors to a detail in the bigger picture. A huge brown object, a kind of a deformed globe, fills the emptiness behind them. The tension between the colossal object in the just as colossal emptiness and the mumbling of the performers is what creates meaning. Each by itself means nothing…”
Pieter T’Jonck
Artistic Direction
Vera Mantero
Performance and Co-Creation
Brynjar Bandlien, Loup Abramovici, Marcela Levi, Pascal Quéneau, Antonija Livingstone (now replaced by Andrea Stotter), Vera Mantero
Visual Installation and Costume Design
Nadia Lauro
Life Music and Sound Engineering
Boris Hauf
Light Design
Jean-Michel Le Lez
Dramaturgic Collaboration
Bojana Bauer
Executive Production
O Rumo do Fumo
O Rumo do Fumo is supported by
GOVERNO DE PORTUGAL - SECRETÁRIO DO ESTADO DA CULTURA / DIRECÇÃO-GERAL DAS ARTES
PERFORMED AT:
12 June 2010, Teatro Viriato, Viseu/Portugal
19 and 21 July 2008, Kalamata International Dance Festival, Kalamata/Greece
5 July 2008, Centro Cultural Vila Flor, Guimarães/Portugal
17 and 18 June 2008, InTransit, Haus der Kulturen der Welt, Berlin/Germany
1 and 2 June 2008, Festival Alkantara, Teatro Meridional, Lisbon/Portugal
2 November 2007, Festival Trama, Fundação de Serralves, Porto/Portugal
3 and 4 June 2007, 24th Dance Week Festival, Zagreb/Croacia
15 March 2007, Festival de Dansa…o no !, Mercat de les Flors, Barcelona/Spain
23 and 24 February 2007, Kaaitheater, Brussels/Belgium
16 February 2007, Teatro Municipal da Guarda, Guarda/Portugal
23 and 24 November 2006, Culturgest, Lisbon/Portugal
15, 16, 17 and 18 November 2006, Centre Pompidou/Festival D’Automne, Paris/France
9, 10 and 11 November 2006, Le Quartz, Brest/France
8 November 2006, Le Quartz, Brest/France
How to exercise the theatrical situation until exhaustion? To choose a language that is common to us, but that we do not dominate. The “here and now” that we look for is so lengthened that there is no longer a belonging. It is destroyed. We always restart, without ever returning to the same point.
Bojana Bauer
A light and recalcitrant work, Vera Mantero and five performers explore a single proposition that revolves almost completely around language, or better around speech, but also mumbling, grumbling, growling, meowing, humming, stammering and singing. Gestures and dance emerge where the body transforms into an ear or a peculiar soundboard. The piece embraces with theatrical joy an (im)probable future social body and doesn’t shun from the literal or kitsch. Language as a possibility to say ‘we’ and thereby affirm or ‘speak out’ the actual difference of the world we live in – on a political level the work reminds me of Jean-Luc Nancy’s writings. Since collaboration and creation are a social process itself, The extreme exercise has travelled a great distance between its première in Brest and the performances in Brussels: from a strict version that stresses the group as an outlandish choreographic machine, to a loose, ‘juicy’ one that takes as a point of departure the performer’s freedom in dialogue with the public, as yet another social body. Yet potentially it still commutes between these two extremes, voicing the lingering energies and imaginations of a vast spectrum.
Jeroen Peeters
“Almost unisono, but with different accents and facial expressions, they hold a speech about profound and banal ideas alike, without any distinction. No wonder that even after one hour they don’t reach a conclusion. Because of that, the only aim of this piece seems to be to celebrate the bare fact that public and performers are together, contemplating each other. “We are a group, you are a group...” returns as a refrain in the mash of words. As such, the acting of the six performers, their eccentric dresses and the way the public reacts to all this “make” the piece…
…the speech itself does not take place in an indifferent space but on a stage. And a stage is different from a street or a square. It is an empty space, without preconceived meanings or uses, but that is exactly why it arouses great expectations. When the curtain goes up we expect that everything that is there to be seen has a Meaning with a large M. Nobody stumbles on a stage like as they would do on the street. Certainly not if the title of the piece announces such concerns as the Death of God or “the extreme exercise of Beauty”.
Now, this is of course a grotesque speech. Who has still anything significant to add after all that has already been said or written about this? Don't we postulate the terms of God and Beauty above all to seal a breach in our worldview? Are these therefore not empty spaces, onto which everyone projects, after his own taste, his own “meaning of life”? The empty space of the stage meets in Vera Mantero’s work the empty space of words: she takes hold of the emptiness of the stage to hint at the emptiness of any significance. But she does this without despair. The meandering chat that the performers all produce in their own singular way, shows that a group of people “works”, even without God or Beauty. This is the meaning of the casual variant of “we are a group, you are a group...”. All of a sudden it becomes: “we are, you are... a theory, full of life”. Nothing has been proved, but “it works”.
Lauro’s mise-en-scène expresses this convincingly. A strong battery of spotlights frames the big stage, and in this way almost reduces the actors to a detail in the bigger picture. A huge brown object, a kind of a deformed globe, fills the emptiness behind them. The tension between the colossal object in the just as colossal emptiness and the mumbling of the performers is what creates meaning. Each by itself means nothing…”
Pieter T’Jonck
Artistic Direction
Vera Mantero
Performance and Co-Creation
Brynjar Bandlien, Loup Abramovici, Marcela Levi, Pascal Quéneau, Antonija Livingstone (now replaced by Andrea Stotter), Vera Mantero
Visual Installation and Costume Design
Nadia Lauro
Life Music and Sound Engineering
Boris Hauf
Light Design
Jean-Michel Le Lez
Dramaturgic Collaboration
Bojana Bauer
Executive Production
O Rumo do Fumo
O Rumo do Fumo is supported by
GOVERNO DE PORTUGAL - SECRETÁRIO DO ESTADO DA CULTURA / DIRECÇÃO-GERAL DAS ARTES
PERFORMED AT:
12 June 2010, Teatro Viriato, Viseu/Portugal
19 and 21 July 2008, Kalamata International Dance Festival, Kalamata/Greece
5 July 2008, Centro Cultural Vila Flor, Guimarães/Portugal
17 and 18 June 2008, InTransit, Haus der Kulturen der Welt, Berlin/Germany
1 and 2 June 2008, Festival Alkantara, Teatro Meridional, Lisbon/Portugal
2 November 2007, Festival Trama, Fundação de Serralves, Porto/Portugal
3 and 4 June 2007, 24th Dance Week Festival, Zagreb/Croacia
15 March 2007, Festival de Dansa…o no !, Mercat de les Flors, Barcelona/Spain
23 and 24 February 2007, Kaaitheater, Brussels/Belgium
16 February 2007, Teatro Municipal da Guarda, Guarda/Portugal
23 and 24 November 2006, Culturgest, Lisbon/Portugal
15, 16, 17 and 18 November 2006, Centre Pompidou/Festival D’Automne, Paris/France
9, 10 and 11 November 2006, Le Quartz, Brest/France
8 November 2006, Le Quartz, Brest/France
segunda-feira, 21 de janeiro de 2013
terça-feira, 21 de agosto de 2012
francine LeClercq: Narcissus
francine LeClercq: Narcissus: OCTOBER 2-27, 2012 Francine LeClercq: Narcissus Opening Reception: Thursday, October 4th, 6-8PM SOHO2O CHELSEA Gallery ...
quarta-feira, 27 de junho de 2012
sexta-feira, 30 de março de 2012
sexta-feira, 23 de março de 2012
terça-feira, 14 de fevereiro de 2012
terça-feira, 15 de novembro de 2011
mundos e portas
Malditos poetas, mau caminho na terra e no mundo que gosta de alcatrão, novo, laboratorial, sem base fóssil. O mundo tem mundos e portas dentro da porta do mundo, e as raparigas perguntam as respostas sem espelhos ou espelhos das portas no mundo da porta que a rapariga abre, antes da porta, no mundo do espelho apagado na porta de outro espelho... que poeta pode ser o que uma rapariga precisa do mundo? A porta - nada mais - sem espelho, luz ou sombra caída, quando a rapariga não vê a poesia e pergunta ao poema onde está o poeta;
em que bolso escondes a chave?
malditos poemas com poetas dentro, horas deixadas no espelho embaciado, sem estrela ou significante aparentemente plausível, ruminados e mesmo assim mundo para porta com portas e mundos dentro.
Raul Albuquerque
a rapariga bateu à porta do poeta e ele ofereceu-lhe um livro com cerejas dentro. e agora não conseguem parar de conversar. malditos caroços, que já nem atrapalham a poesia, porque ele retira-os, como se retiram as vírgulas em excesso de um texto cheio de soluços.
a rapariga e o poeta riem e choram com o mar à frente sem pontuação
rapariga anónima
quarta-feira, 5 de outubro de 2011
sexta-feira, 30 de setembro de 2011
DOS POETAS
DAS RAPARIGAS
Outros devem ir por longos caminhos
até aos obscuros poetas;
perguntam sempre a alguém
se não terão visto algum cantando
ou de mãos pousadas em cordas.
Só as raparigas não perguntam
que ponte leva às imagens;
sorriem só, mais luminosas que fiadas de pérolas
guardadas em conchas de prata.
Cada porta das suas vidas abre
para um poeta
e para o mundo.
Rainer Maria Rilke
Outros devem ir por longos caminhos
até aos obscuros poetas;
perguntam sempre a alguém
se não terão visto algum cantando
ou de mãos pousadas em cordas.
Só as raparigas não perguntam
que ponte leva às imagens;
sorriem só, mais luminosas que fiadas de pérolas
guardadas em conchas de prata.
Cada porta das suas vidas abre
para um poeta
e para o mundo.
Rainer Maria Rilke
DA RAPARIGA
malditos poetas, mau caminho, terra e o mundo gosta de alcatrão, mas o mundo tem mundos dentro e portas dentro da porta dos mundo e as raparigas perguntam as respostas sem espelhos, ou espelhos das portas no mundo da porta que a rapariga abre, antes da porta no mundo do espelho apagado na porta de outro espelho... que poeta pode ser o que uma rapariga precisa do mundo, o porta, nada mais, sem espelho, luz ou sombra caídos quando a rapariga não vê a poesia e pergunta ao poema onde está o poeta, em que bolso esconde a chave
Raul Albuquerque
domingo, 25 de setembro de 2011
o que se passa quando não se passa nada
De novo na esplanada do café de Perec, espero, em vão como sempre, que passe Catherine Deneuve, que vive na praça. Mas, uma vez mais, ela não aparece. Surpreende-me, um pouco mais tarde, ler na revista Lire que Vargas Llosa também vive nessa praça, tem um dúplex num edifício do século XVIII: "Neste bairro, sinto-me como em casa, É um bairro muito literário. Umberto Eco também vive na praça. Há quinze amos que espero ver Catherine Deneuve, mas ela nunca aparece."
Nesse momento, aparece Deneuve. Fico mudo de surpresa e pergunto-me se, durante um momento, Deneuve não foi ".
DIÁRIO VOLÚVEL, 2006 - Janeiro, pag. 16
Enrique Vila-Matas
DIÁRIO VOLÚVEL, 2006 - Janeiro, pag. 16
Enrique Vila-Matas
segunda-feira, 19 de setembro de 2011
segunda-feira, 9 de maio de 2011
Bluebird - Charles Bukowski
wants to get out
but I'm too tough for him,
I say, stay in there, I'm not going
to let anybody see
you.
there's a bluebird in my heart that
wants to get out
but I pur whiskey on him and inhale
cigarette smoke
and the whores and the bartenders
and the grocery clerks
never know that
he's
in there.
there's a bluebird in my heart that
wants to get out
but I'm too tough for him,
I say,
stay down, do you want to mess
me up?
you want to screw up the
works?
you want to blow my book sales in
Europe?
there's a bluebird in my heart that
wants to get out
but I'm too clever, I only let him out
at night sometimes
when everybody's asleep.
I say, I know that you're there,
so don't be
sad.
then I put him back,
but he's singing a little
in there, I haven't quite let him
die
and we sleep together like
that
with our
secret pact
and it's nice enough to
make a man
weep, but I don't
weep, do
you?
sábado, 7 de maio de 2011
quarta-feira, 4 de maio de 2011
CARNE
Bastou-me abrir a porta do apartamento para saber que ainda não saíras definitivamente da minha vida.
O teu cheiro entranhara-se no papel de parede tal como o fedor da serpente se recusa a abandonar a pele descascada. Tomo folgo, cerro os olhos, estico os braços e deixo que as mãos leiam o texto rugoso da parede do corredor. Quatro unhas como quatro garras escavam quatro sulcos, quatro rastilhos de pólvora.
A sala acolhe-me oca, muscular, do tamanho de um punho.
A luz intermitente de faróis amarelos projecta a sombra das lâminas dos estores nas paredes, nuas como telas. Aí se desenham os psicadélicos contornos dos móveis.
Deslizo descalça até ao centro. Em bicos de pé, levanto os braços e tento atingir a lâmpada vermelha.
O teu cheiro continua encarnado.
Abro a janela e deixo que o quarto respire fundo. Sirvo-me um Jameson bem aviado e bebo-o de um só trago. Jogo-me no sofá e sem querer derrubo o atendedor de chamadas.
O som da tua voz espalha-se, espesso e cavernoso: “Ana, … Ana, … atende caralho! Se pensas que isto fica assim, enganas-te… Vais arrepender-te…”.
Atiro-te pela janela fora: “AAAAAAAAnnnnnaaaaaaa!!!!!!”, gritas em pleno voo. Assisto, paralisada, à queda vertiginosa do aparelho que se desfaz em estrondosos estilhaços lá em baixo, na calçada.
Por instantes pensei que sufocava. Fecho a janela, corro os estores, apago a luz, ligo o esquentador. Tiro a roupa e meto-a na máquina de lavar. Entro na banheira, encho os pulmões de ar e mergulho.
Emerjo calma, conscientemente insípida, inodora e incolor.
Seco-me e sento-me na beira da cama. Calço as meias-ligas de nylon. Ponho aquele vestidinho preto e o colar de marcassite que me ofereceste. Vejo-me ao espelho vermelho e pinto os lábios.
Inesperadamente eufórica, canto na sala escura: “If it makes you happy, it couldn’t be that bad! If it makes you happy, why the hell are you so sad?”
Visto o casaco e confiro: chaves do carro, chaves de casa, cartão, chapéu, cachecol. Tranco a porta enquanto trinco uma maçã. Meto-me no carro e arranco.
Ligo a aparelhagem e levo com os Portishead: “… ‘cause nobody loves me, that’s true. Not like you do …” E pensar que há horas atrás apenas isto fazia sentido.
terça-feira, 3 de maio de 2011
CONTER HISTÓRIAS
Compro e meto-me em casa.Por breves instantes esqueço tudo: o nome da rua, o número do bilhete de lotaria, o café ao lume, as letras que compõem as palavras. Sento-me na cama agarrada ao pacote. Dormes a sono solto. Quando acordares estou metida numa embrulhada.Á medida que desfaço o laço, tomo coragem para contar-te tudo.O cavalgar do meu coração é ensurdecedor, mas consigo dominá-lo a tempo, e tu não nem suspeitas.Levanto-me de mansinho e esquivo-me até à casa de banho.A luz ténue que entra pela goteira invade as paredes de azulejo e ilumina o frasquinho. Ergo os braços. Estou nas suas mãos. Deslizo-o por entre os dedos: o frasco é azul e a luz é dourada, a luz é azul e o frasco é dourado, o frasco é a luz e o azul é adorado. Levo-o à boca e bebo até à última gota.Regresso à cama e deito-me a teu lado, amargurada.Por longos instantes lembro-me de tudo: os nomes das coisas, os números das pessoas, o sabor das palavras que aquecem a rotina.O gosto permanente da tinta esvai-se pelo canto da boca e discorre pelo travesseiro.Posso dormir em paz. Chegou a aurora que esperei a vida toda.Quando acordares, lê. Cansei-me de conter histórias.
segunda-feira, 25 de abril de 2011
ENSIMESMADA
A Semicolcheia não ligava a se|mínima à pausa homónima
até vê-la seminua.
Ficou semi|confusa.
Perdeu a cabeça e vagueou pela casa apenas de haste e colchete.
Já não gorjeia, a Semicolcheia.
Perdeu o pio.
Pos-se de canto.
Senta-se à beira da redondez da Semibreve.
Sente-se redundante.
E languidamente semi|suspira por uma pausa que lhe devolva a voz
até vê-la seminua.
Ficou semi|confusa.
Perdeu a cabeça e vagueou pela casa apenas de haste e colchete.
Já não gorjeia, a Semicolcheia.
Perdeu o pio.
Pos-se de canto.
Senta-se à beira da redondez da Semibreve.
Sente-se redundante.
E languidamente semi|suspira por uma pausa que lhe devolva a voz
quinta-feira, 24 de março de 2011
segunda-feira, 21 de março de 2011
sábado, 5 de março de 2011
ARTE POÉTICA
Se o poema não serve para dar o nome às coisas
outro nome e ao seu silêncio outro silêncio,
se não serve para abrir o dia
em duas metades como dois dias resplandecentes
e para dizer o que cada um quer e precisa
ou o que a si mesmo nunca disse.
Se o poema não serve para que o amigo ou a amiga
entrem nele como numa ampla esplanada
e se sentem a conversar longamente com um copo de vinho na mão
sobre as raízes do tempo ou o sabor da coragem
ou como tarda a chegar o tempo frio.
Se o poema não serve para tirar o sono a um canalha
ou ajudar a dormir o inocente
se é inútil para o desejo e o assombro,
para a memória e para o esquecimento.
Se o poema não serve para tornar quem o lê
num fanático
que o poeta então se cale.
António Ramos Rosa
O poeta na rua, Quasi
outro nome e ao seu silêncio outro silêncio,
se não serve para abrir o dia
em duas metades como dois dias resplandecentes
e para dizer o que cada um quer e precisa
ou o que a si mesmo nunca disse.
Se o poema não serve para que o amigo ou a amiga
entrem nele como numa ampla esplanada
e se sentem a conversar longamente com um copo de vinho na mão
sobre as raízes do tempo ou o sabor da coragem
ou como tarda a chegar o tempo frio.
Se o poema não serve para tirar o sono a um canalha
ou ajudar a dormir o inocente
se é inútil para o desejo e o assombro,
para a memória e para o esquecimento.
Se o poema não serve para tornar quem o lê
num fanático
que o poeta então se cale.
António Ramos Rosa
O poeta na rua, Quasi
MADISON AVENUE
Convém fugir das pessoas. Os amigos
têm palavras, gestos e olhares
com uma pedra dentro que faz mal.
Convém fugir das pessoas. A família
é a mão que segura a cabeça
para que esta debaixo de água permaneça.
E o amor é apenas essa palavra
que uma mulher nos atira para os braços.
Ao ir-se a mulher, seu nome dói.
É grato à alma estar-se isolado.
É grato ao corpo estar isolado.
Morrer é só isolar-se um pouco mais.
com uma pedra dentro que faz mal.
Convém fugir das pessoas. A família
é a mão que segura a cabeça
para que esta debaixo de água permaneça.
E o amor é apenas essa palavra
que uma mulher nos atira para os braços.
Ao ir-se a mulher, seu nome dói.
É grato à alma estar-se isolado.
É grato ao corpo estar isolado.
Morrer é só isolar-se um pouco mais.
J.M. Fonollosa
in Cidade do Homem: New York, Antígona
ONDE A POESIA...
Onde a poesia se exibe como um espectáculo espectacular
não é poesia
onde a audácia do poema não é única
não é poesia
onde a poesia não é inocência de natureza fluvial
não é poesia
onde a poesia não é escandalosamente pura
não é poesia
onde a poesia não é filha do deserto nem da sede
não é poesia
onde a poesia não é presença viva que nasce da solidão e da ausência
não é poesia
onde a poesia não se oferece no seu abandono
não é poesia
onde a poesia não é poesia
não é poesia
António Ramos Rosa
O poeta na rua, selecção e prefácio de Ana Paula Coutinho Mendes, Quasi
não é poesia
onde a audácia do poema não é única
não é poesia
onde a poesia não é inocência de natureza fluvial
não é poesia
onde a poesia não é escandalosamente pura
não é poesia
onde a poesia não é filha do deserto nem da sede
não é poesia
onde a poesia não é presença viva que nasce da solidão e da ausência
não é poesia
onde a poesia não se oferece no seu abandono
não é poesia
onde a poesia não é poesia
não é poesia
António Ramos Rosa
O poeta na rua, selecção e prefácio de Ana Paula Coutinho Mendes, Quasi
sexta-feira, 4 de março de 2011
XVIII
quinta-feira, 3 de março de 2011
EM SEGUNDA FILA NA ESTANTE
Há um livro que nunca chegarás
a ler um livro que te escapou
da mão estava exposto na livraria
mas outra coisa chamou a tua
atenção ou alguém o arrumou em segunda fila na estante...
Tu não o sabes - como o poderias
saber? - mas esse livro descreve
como e quando vais morrer
Jorge de Sousa Braga
a ler um livro que te escapou
da mão estava exposto na livraria
mas outra coisa chamou a tua
atenção ou alguém o arrumou em segunda fila na estante...
Tu não o sabes - como o poderias
saber? - mas esse livro descreve
como e quando vais morrer
Jorge de Sousa Braga
EM SEGUNDA FILA NA ESTANTE
Há um livro que nunca chegarás
a ler um livro que te escapou
da mão estava exposto na livraria
mas outra coisa chamou a tua
atenção ou alguém o arrumou em segunda fila na estante...
Tu não o sabes - como o poderias
saber? - mas esse livro descreve
como e quando vais morrer
Jorge Sousa Braga
a ler um livro que te escapou
da mão estava exposto na livraria
mas outra coisa chamou a tua
atenção ou alguém o arrumou em segunda fila na estante...
Tu não o sabes - como o poderias
saber? - mas esse livro descreve
como e quando vais morrer
Jorge Sousa Braga
quarta-feira, 2 de março de 2011
EXÓNIMO PROCURA-SE
À procura de um exónimo...
Krystyna (In Polish)
Kristina (In Swedish, Czech, Russian and in German)
Kirsten (In Scandinavian)
Christine (In French and in English)
Christian (In English and in French)
Christina (In English)
Kristy (In English)
e ainda...
In Swedish: Kjerstin
In Scottish: Kirstin (F)
In Scandinavian and in German: Kristin
In Scandinavian: Stina
In Italian, Spanish, Portuguese and in Romanian: Cristina
In Italian: Cristiana
In Hungarian: Krisztina
In German, Scandinavian and in English: Christa
In German: Kristen
In German: Kerstin
In Finnish: Kirsi
In Finnish and Estonian: Kristiina
In English (Modern): Krystina
In English: Kristia
In Bulgarian: Hristina
Krystyna (In Polish)
Kristina (In Swedish, Czech, Russian and in German)
Kirsten (In Scandinavian)
Christine (In French and in English)
Christian (In English and in French)
Christina (In English)
Kristy (In English)
e ainda...
In Swedish: Kjerstin
In Scottish: Kirstin (F)
In Scandinavian and in German: Kristin
In Scandinavian: Stina
In Italian, Spanish, Portuguese and in Romanian: Cristina
In Italian: Cristiana
In Hungarian: Krisztina
In German, Scandinavian and in English: Christa
In German: Kristen
In German: Kerstin
In Finnish: Kirsi
In Finnish and Estonian: Kristiina
In English (Modern): Krystina
In English: Kristia
In Bulgarian: Hristina
ESTENDE A TUA MÃO
estende a tua mão contra a minha boca e respira,
e sente como respiro contra ela,
e sem que eu nada diga,
sente a trémula, tocada coluna de ar
a sorvo e sopro,
ó
táctil, ininterrupta,
e a tua mão sinta contra mim
quanto aumenta o mundo
Herberto Helder
in a faca não corta o fogo
e sente como respiro contra ela,
e sem que eu nada diga,
sente a trémula, tocada coluna de ar
a sorvo e sopro,
ó
táctil, ininterrupta,
e a tua mão sinta contra mim
quanto aumenta o mundo
Herberto Helder
in a faca não corta o fogo
"I like the word `decadent,’ All shimmering with purple and gold … it throws out the brilliance of flames and the gleam of precious stones. It is made up of carnal spirit and unhappy flesh and of all the violent splendors of the Lower Empire; it conjures up the paint of the courtesans, the sports of the circus, the breath of the tamers of animals, the bounding of wild beasts, the collapse among the flames of races exhausted by the power of feeling, to the invading sound of enemy trumpets. The decadence is Sardanapalus lighting the fire in the midst of his women, it is Seneca declaiming poetry as he opens his veins, it is Petronius masking his agony with flowers."
– Paul Verlaine
– Paul Verlaine
DIÁRIO
A partir de agora, todo o poema que fale de amor, fora.
Todo o poema que não revolucione, fora.
Todo o poema que não ensine, fora.
Todo o poema que não salve vidas, fora.
Todo o poema que não se sobreviva, fora.
Vou deixar um anúncio no jornal:
Procura-se poeta. Trespasso-me.
Criatura 4
(Ana Salomé, p.13)
Todo o poema que não revolucione, fora.
Todo o poema que não ensine, fora.
Todo o poema que não salve vidas, fora.
Todo o poema que não se sobreviva, fora.
Vou deixar um anúncio no jornal:
Procura-se poeta. Trespasso-me.
Criatura 4
(Ana Salomé, p.13)
AS PALAVRAS
Vira-as,
pega-as pelo rabo (chiai, putas),
açoita-as,
adoça-lhes a boca às reguilas,
enche-as, balões, pica-as,
chupa-lhes sangue e tutano,
seca-as,
capa-as,
pisa-as, galo galante,
torce-lhes o gasganete, cozinheiro,
depena-as,
estripa-as, toiro,
boi, arrasta-as,
fá-las, poeta,
faz que se traguem todas as tuas palavras.
- Octavio Paz
(tradução de Albino M.)
pega-as pelo rabo (chiai, putas),
açoita-as,
adoça-lhes a boca às reguilas,
enche-as, balões, pica-as,
chupa-lhes sangue e tutano,
seca-as,
capa-as,
pisa-as, galo galante,
torce-lhes o gasganete, cozinheiro,
depena-as,
estripa-as, toiro,
boi, arrasta-as,
fá-las, poeta,
faz que se traguem todas as tuas palavras.
- Octavio Paz
(tradução de Albino M.)
"A desventura máxima é a solidão. É tão verdade que o reconforto supremo - a religião - consiste em encontrar uma companhia que nunca falhe - Deus. A oração é um desabafo, como com um amigo. A obra equivale à oração, porque nos põe em contacto com os que dela tirarão proveito. O problema da vida é, portanto, o seguinte: como romper anossa solidão, como comunicar com os outros. Assim se explica a existência do matrimónio, da paternidade, das amizades. Mas que a felicidade resida nisto, balelas! Porque se deva estar melhor comunicando com os outros do que só, é estranho. É talvez apenas uma ilusão: a maior parte do tempo, estamos muitíssimo bem sós. É agradável ter, de tempos a tempos, um odre em que nos possamos despejar e, em seguida, bebermo-nos a nós próprios: dado que pedimos aos outros apenas aquilo que já temos em nós. É um mistério o motivo por que não basta perscrutar e beber em nós próprios e seja preciso reavermo-nos por intermédio dos outros. (O sexo é um incidente: o que recebemos é momentâneo e casual; pretendemos algo de mais secreto e misterioso de que o sexo é apenas um sinal, um símbolo)."
Cesare Pavese
Cesare Pavese
SE EU PUDESSE
Se eu pudesse
ter-te em vez dos versos,
ou ter um verso
em vez de ti,
ou ter os olhos
como os de um gato
para perscrutar a noite
onde isso se decide.
Pedro Mexia
Avalanche, Quasi, Vila Nova de Famalicão, 2001
ter-te em vez dos versos,
ou ter um verso
em vez de ti,
ou ter os olhos
como os de um gato
para perscrutar a noite
onde isso se decide.
Pedro Mexia
Avalanche, Quasi, Vila Nova de Famalicão, 2001
RILKE SHAKE
salta um rilke shake
com amor & ovomaltine
quando passo a noite insone
e não há nada que ilumine
eu peço um rilke shake
e como um toasted blake
sunny side para cima
quando estou triste
& sozinha enquanto
o amor não cega
bebo um rilke shake
e roço um toasted blake
na epiderme da manteiga
nada bate um rilke shake
no quesito anti-heartache
nada supera a batida
de um rilke com sorvete
por mais que você se deite
se deleite e se divirta
tem noites que a lua é fraca
as estrelas somem no piche
e aí quando não há cigarro
não há cerveja que preste
eu peço um rilke shake
engulo um toasted blake
e danço que nem dervixe
Angélica Freitas
com amor & ovomaltine
quando passo a noite insone
e não há nada que ilumine
eu peço um rilke shake
e como um toasted blake
sunny side para cima
quando estou triste
& sozinha enquanto
o amor não cega
bebo um rilke shake
e roço um toasted blake
na epiderme da manteiga
nada bate um rilke shake
no quesito anti-heartache
nada supera a batida
de um rilke com sorvete
por mais que você se deite
se deleite e se divirta
tem noites que a lua é fraca
as estrelas somem no piche
e aí quando não há cigarro
não há cerveja que preste
eu peço um rilke shake
engulo um toasted blake
e danço que nem dervixe
Angélica Freitas
vestem-se as dores
nos bastidores da minha memória
esta é a puta
que estendeu a mão
após descruzar as pernas
esta é a ingénua
não estendeu a mão
após descruzar as pernas
esta é a nostálgica
traz a mão estendida
nunca descruzou as pernas
despem-se as dores nos
bastidores da minha memória
Benedicte Houart,
inimigo rumor
nos bastidores da minha memória
esta é a puta
que estendeu a mão
após descruzar as pernas
esta é a ingénua
não estendeu a mão
após descruzar as pernas
esta é a nostálgica
traz a mão estendida
nunca descruzou as pernas
despem-se as dores nos
bastidores da minha memória
Benedicte Houart,
inimigo rumor
NINGUÉM SE LEMBRA
De quem ao coração vai buscar água
ninguém se lembra nem
de quem por tê-lo
pregado à pele mostra os seus pregos ferrugentos.
Luís Miguel Nava
Poesia Completa (1979-1994)
Rebentação
ninguém se lembra nem
de quem por tê-lo
pregado à pele mostra os seus pregos ferrugentos.
Luís Miguel Nava
Poesia Completa (1979-1994)
Rebentação
"let's start a magazine
to hell with literature
we want something redblooded
lousy with pure
reeking with stark
and fearlessly obscene
but really clean
get what I mean
let’s not spoil it
let’s make it serious
something authentic and delirious
you know something genuine like a mark
in a toilet
graced with guts and gutted
with grace"
squeeze your nuts and open your face
e. e. cummings,
No Thanks (1935)
to hell with literature
we want something redblooded
lousy with pure
reeking with stark
and fearlessly obscene
but really clean
get what I mean
let’s not spoil it
let’s make it serious
something authentic and delirious
you know something genuine like a mark
in a toilet
graced with guts and gutted
with grace"
squeeze your nuts and open your face
e. e. cummings,
No Thanks (1935)
ÉMULOS
Foi como amor aquilo que fizemos
ou tacto tácito? – os dois carentes
e sem manhã sujeitos ao presente;
foi logro aceite quando nos fodemos
Foi circo ou cerco, gesto ou estilo
o acto de abraçarmos? foi candura
o termos juntos sexo com ternura
num clima de aparato e de sigilo.
Se virmos bem ninguém foi iludido
de que era a coisa em si – só o placebo
com algum excesso que acelera a líbido.
E eu, palavrosa, injusta desconcebo
o zelo de que nada fosse dito
e quanto quis tocar em estado líquido.
Margarida Vale de Gato
Mulher ao Mar, Mariposa Azual, 2010
ou tacto tácito? – os dois carentes
e sem manhã sujeitos ao presente;
foi logro aceite quando nos fodemos
Foi circo ou cerco, gesto ou estilo
o acto de abraçarmos? foi candura
o termos juntos sexo com ternura
num clima de aparato e de sigilo.
Se virmos bem ninguém foi iludido
de que era a coisa em si – só o placebo
com algum excesso que acelera a líbido.
E eu, palavrosa, injusta desconcebo
o zelo de que nada fosse dito
e quanto quis tocar em estado líquido.
Margarida Vale de Gato
Mulher ao Mar, Mariposa Azual, 2010
UM INSTANTE
Aqui me tenho
como não me conheço
nem me quis
sem começo
nem fim
aqui me tenho
sem mim
nada lembro
nem sei
à luz presente
sou apenas um bicho
transparente
Ferreira Gullar,
Muitas Vozes (1999)
como não me conheço
nem me quis
sem começo
nem fim
aqui me tenho
sem mim
nada lembro
nem sei
à luz presente
sou apenas um bicho
transparente
Ferreira Gullar,
Muitas Vozes (1999)
EPIGRAMA COM SUMO
Desfolhando o livro
como se descascasse a laranja,
as palavras caíam-lhe como gomos
por entre os lábios
Nuno Júdice
como se descascasse a laranja,
as palavras caíam-lhe como gomos
por entre os lábios
Nuno Júdice
ÉPIGRAMME
Aimons, foutons, ce sont plaisirs
Qu´il ne faut pas que l´on sépare;
La jouissance et les désirs
Sont ce que l´âme a de plus rare.
D´un vit, d´un con, et de deux coeurs,
Naît un accord plein de douceurs,
Que les dévots blâment sans cause.
Amarillis, pensez-y-bien:
Aimer sans foutre est peu de chose
Foutre sans aimer ce n´est rien.
La Fontaine
via Poesia Incompleta
Qu´il ne faut pas que l´on sépare;
La jouissance et les désirs
Sont ce que l´âme a de plus rare.
D´un vit, d´un con, et de deux coeurs,
Naît un accord plein de douceurs,
Que les dévots blâment sans cause.
Amarillis, pensez-y-bien:
Aimer sans foutre est peu de chose
Foutre sans aimer ce n´est rien.
La Fontaine
via Poesia Incompleta
A TERCEIRA COISA
Ela vinha.
tu falavas-lhe
até que a podias já tocar
E agora é a tua fala
quem lhe toca
de tão perto
que mais que ouvi-la
ela a sente.
Ela vem e chega.
Tu a descobres ou inventas,
mas decide-te.
Eu descubro-te e invento-te
e então eu oiço-a dizer-nos:
Eu sou a terceira coisa;
A personagem: o herói -
- a terceira pessoa.
Manuel Gusmão,
A Terceira Mão
Caminho
tu falavas-lhe
até que a podias já tocar
E agora é a tua fala
quem lhe toca
de tão perto
que mais que ouvi-la
ela a sente.
Ela vem e chega.
Tu a descobres ou inventas,
mas decide-te.
Eu descubro-te e invento-te
e então eu oiço-a dizer-nos:
Eu sou a terceira coisa;
A personagem: o herói -
- a terceira pessoa.
Manuel Gusmão,
A Terceira Mão
Caminho
BARTLEBY
- Bartleby!
Não houve resposta.
- Bartleby! - agora num tom mais forte.
- Bartleby! - berrei.
Tal qual um fantasma, afecto às leis da invocação mágica, à terceira chamada apareceu ele à entrada do seu ermitério.
- Vá à sala ao lado e diga ao Nippers que venha aqui.
- Preferia não o fazer - disse ele lenta e respeitosamente, e calmamente desapareceu.
Bartleby,
Herman Melville
Assírio & Alvim
Não houve resposta.
- Bartleby! - agora num tom mais forte.
- Bartleby! - berrei.
Tal qual um fantasma, afecto às leis da invocação mágica, à terceira chamada apareceu ele à entrada do seu ermitério.
- Vá à sala ao lado e diga ao Nippers que venha aqui.
- Preferia não o fazer - disse ele lenta e respeitosamente, e calmamente desapareceu.
Bartleby,
Herman Melville
Assírio & Alvim
26
O TABERNEIRO hoje está risonho - trouxeram-lhe pornografia fresquinha e ele gosta disso. O pior é a família, aburguesada, censória... Terá de escondê-la, como aos goles pela garrafa, de meia em meia hora.
É triste um adulto ter de esconder as mãos.
Miguel Martins,
O Taberneiro
Poesia Incompleta
É triste um adulto ter de esconder as mãos.
Miguel Martins,
O Taberneiro
Poesia Incompleta
BEIJO IX
Não me dês sempre um beijo húmido,
nem sussurros acompanhados de doces risos,
nem sempre tombes enleada,
no meu pescoço, desfalecida.
Também as doçuras têm a sua medida.
(...)
Jean Everaerts
Mil Vezes Mil Beijos
O Livro dos Beijos
nem sussurros acompanhados de doces risos,
nem sempre tombes enleada,
no meu pescoço, desfalecida.
Também as doçuras têm a sua medida.
(...)
Jean Everaerts
Mil Vezes Mil Beijos
O Livro dos Beijos
CONDIÇÕES MÍNIMAS
Esta sarça é interdita a matilhas;
há que mudar a pele para comer
o fogo. Não que eu faça render
qualquer talento, ou tenha em vasilhas
semi-intactas ilustres maravilhas:
uma lista de coisas a fazer,
solidão, pedra de isqueiro, um revólver,
e um aparelho já com pouca pilha
e que só uso eu; a nós vontade
basta - e alguma luz: pede-se intensa,
mas sem que obste o brilho à entrega cega,
aceitas? compreendes? aguentas?
no nervo negro desta densidade
penetra só sentindo que sustentas
e me conténs quando eu me desintegro.
Margarida Vale do Gato,
Relâmpago magazine, 2010
há que mudar a pele para comer
o fogo. Não que eu faça render
qualquer talento, ou tenha em vasilhas
semi-intactas ilustres maravilhas:
uma lista de coisas a fazer,
solidão, pedra de isqueiro, um revólver,
e um aparelho já com pouca pilha
e que só uso eu; a nós vontade
basta - e alguma luz: pede-se intensa,
mas sem que obste o brilho à entrega cega,
aceitas? compreendes? aguentas?
no nervo negro desta densidade
penetra só sentindo que sustentas
e me conténs quando eu me desintegro.
Margarida Vale do Gato,
Relâmpago magazine, 2010
Gostava de gostar de gostar.
Um momento... Dá-me de ali um cigarro,
Do maço em cima da mesa-de-cabeceira.
Continua... Dizias
Que no desenvolvimento da metafísica
De Kant a Hegel
Alguma coisa se perdeu.
Concordo em absoluto.
Estive realmente a ouvir.
Nondum amabam et amare amabam (Santo Agostinho).
Que coisa curiosa estas associações de ideias!
Estou fatigado de estar pensando em sentir outra coisa.
Obrigado. Deixa-me acender. Continua. Hegel...
Álvaro de Campos
Um momento... Dá-me de ali um cigarro,
Do maço em cima da mesa-de-cabeceira.
Continua... Dizias
Que no desenvolvimento da metafísica
De Kant a Hegel
Alguma coisa se perdeu.
Concordo em absoluto.
Estive realmente a ouvir.
Nondum amabam et amare amabam (Santo Agostinho).
Que coisa curiosa estas associações de ideias!
Estou fatigado de estar pensando em sentir outra coisa.
Obrigado. Deixa-me acender. Continua. Hegel...
Álvaro de Campos
HAPPINESS
So early it's still almost dark out.
I'm near the window with coffee,
and the usual early morning stuff
that passes for thought.
When I see the boy and his friend
walking up the road
to deliver the newspaper.
They wear caps and sweaters,
and one boy has a bag over his shoulder.
They are so happy
they aren't saying anything, these boys.
I think if they could, they would take
each other's arm.
It's early in the morning,
and they are doing this thing together.
They come on, slowly.
The sky is taking on light,
though the moon still hangs pale over the water.
Such beauty that for a minute
death and ambition, even love,
doesn't enter into this.
Happiness. It comes on
unexpectedly. And goes beyond, really,
any early morning talk about it.
Raymond Carver
I'm near the window with coffee,
and the usual early morning stuff
that passes for thought.
When I see the boy and his friend
walking up the road
to deliver the newspaper.
They wear caps and sweaters,
and one boy has a bag over his shoulder.
They are so happy
they aren't saying anything, these boys.
I think if they could, they would take
each other's arm.
It's early in the morning,
and they are doing this thing together.
They come on, slowly.
The sky is taking on light,
though the moon still hangs pale over the water.
Such beauty that for a minute
death and ambition, even love,
doesn't enter into this.
Happiness. It comes on
unexpectedly. And goes beyond, really,
any early morning talk about it.
Raymond Carver
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